Escrevo para desaparecer
Sob as frestas
Da floresta insone;
Através do labirinto
Pop-cultural
Onde, mais que a obra,
O que sobra
(E se pretende imortal)
É o nome.
Escrevo sobre a folha, poemas:
Papel e caneta
Matam minha fome.
Os fonemas
São amigos argutos,
Vestidos de onomatopéias:
Não são Césares
Ou Brutus,
Nem heróis de falsas odisséias.
Escrevo para o mundo real
Uma fábula sem importância:
Quero desafiar, desmontar o banal
Dessa gente fake
E sem substância.
Escrevo
Para quebrar
O espelho vazio,
Esse frágil
“Liame com o mundo”.
Às vezes
Sou como cão no cio;
Minha poesia é a dama
Beijando o vagabundo.
O poema me chama
Mas, como se chama
O poema?
Nesse teorema
Não quero luzes
Nem cruzes
Na batalha da escrita:
Que ninguém tema
Minha certeira bala,
Atingindo outra alma aflita.
O poema grita
Quando alguém o cala,
E fala alto
Quando se irrita.
Reflita:
Escrevo
Para ”suscitar liberdades”;
Nada que digo
Cabe em mim
E nunca sei
Se há mentira ou verdade
Tranqüilidade ou perigo
No começo do meu fim.
Escrevo para atravessar
A linha tênue
Que separa
O espetáculo
Do espetacular.
Palavra por palavra
O poema é receptáculo
Daquilo que quero falar.
Tento especular,
Mas diante
Da linha do tempo,
Lentamente
Minha poesia dá ré,
Até
Ré – começar.
Augusto Dias
'O Teatro Mágico'
'O Teatro Mágico'