Todas histórias aqui escritas circulam pela internet, normalmente por correio eletrônico, e que aparecem aqui e ali, com alguns detalhes alterados, de tal forma que não é possível determinar se algumas são autênticas ou não. O certo é que, verdadeiras ou não, todas elas emocionam, edificam e, principalmente, deixam uma lição que pode ser de grande ajuda, especialmente em momentos críticos.

28 de junho de 2013

A floresta

Rio de Janeiro

 Sobre o dorso possante do cavalo
 Banhado pela luz do sol nascente 
 Eu penetrei o atalho, na floresta.
Tudo era força ali, tudo era força
 Força ascencional da natureza.
 A luz que em torvelinhos despenhava
 Sobre a coma verdíssima da mata
 Pelos claros das árvores entrava
 E desenhava a terra de arabescos.
 Na vertigem suprema do galope
 Pelos ouvidos, doces, perpassavam
 Cantos selvagens de aves indolentes.
 A branda aragem que do azul descia
 E nas folhas das árvores brincava
 Trazia à boca um gosto saboroso
 De folha verde e nova e seiva bruta.
 Vertiginosamente eu caminhava
 Bêbado da frescura da montanha
 Bebendo o ar estranguladamente.
 Às vezes, a mão firme apaziguava
 O impulso ardente do animal fogoso
 Para ouvir de mais perto o canto suave
 De alguma ave de plumagem rica
 E após, soltando as rédeas ao cavalo Ia de novo loucamente à brisa. 

 De repente parei. Longe, bem longe Um ruído indeciso, informe ainda 
Vinha às vezes, trazido pelo vento.
 Apenas branda aragem perpassava
 E pelo azul do céu, nenhuma nuvem.
 Que seria?
De novo caminhando
 Mais distinto escutava o estranho ruído
 Como que o ronco baixo e surdo e cavo
 De um gigante de lenda adormecido.



A cachoeira,
Senhor! A cachoeira! Era ela. Meu Deus, que majestade!
 Desmontei. Sobre a borda da montanha
 Vendo a água lançando-se em peitadas
 Em contorsões, em doidos torvelinhos
 Sobre o rio dormente e marulhoso
 Eu tive a estranha sensação da morte. 

 Em cima o rio vinha espumejante
 Apertando entre as pedras pardacentas
 Rápido e se sacudindo em branca espuma.
 De repente era o vácuo embaixo, o nada
 A queda célere e desamparada
 A vertigem do abismo, o horror supremo
 A água caindo, apavorada, cega
 Como querendo se agarrar nas pedras
 Mas caindo, caindo, na voragem
 E toda se estilhaçando, espumecente. 

Lá fiquei longo tempo sobre a rocha
 Ouvindo o grande grito que subia
 Cheio, eu também, de gritos interiores.
 Lá fiquei, só Deus sabe quanto tempo
 Sufocando no peito o sofrimento
 Caudal de dor atroz e inapagável
 Bem mais forte e selvagem do que a outra.
 Feita ela toda de esperança
 De não poder sentir a natureza
 Com o espírito em Deus que a fez tão bela.

 Quando voltei, já vinha o sol mais alto
 E alta vinha a tristeza no meu peito.
 Eu caminhei.
De novo veio o vento
 Os pássaros cantaram novamente
 De novo o aroma rude da floresta
 De novo o vento.
Mas eu nada via.
 Eu era um ser qualquer que ali andava
 Que vinha para o ponto de onde viera
 Sem sentido, sem luz, sem esperança
 Sobre o dorso cansado de um cavalo.

Vinicius de Moraes